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Universal x TikTok: entenda o impacto desse embate

Atualizado: 6 de fev.



TikTok, Universal, Billie Eilish, Bad Bunny, Taylor Swift, Ariana Grande

2024 já começou com uma mudança significativa que tem grande repercussão: depois de vários meses de negociação, o Universal Music Group (UMG) e o TikTok romperam relações, o que resultou na remoção de todas as músicas da gravadora da plataforma. Os motivos do “divórcio” entre essas duas gigantes de suas indústrias foi um misto de insatisfação com relação à compensação, à proteção dos artistas e com questões de segurança online. Isto, pelo menos, é o que a Universal alega. Do outro lado, o app de vídeos curtos acusa a gravadora de não colocar os músicos e os fãs em primeiro lugar, abrindo mão de uma enorme vitrine.


O que pode parecer como uma separação que impacta apenas os artistas da Universal Music é, na verdade, mais profunda. O caso explicita o grande dilema do cenário atual, em que a receita da música nas plataformas digitais segue sendo insatisfatória para todos os envolvidos - porém, sem uma saída que pareça viável tanto para os aplicativos quanto para gravadoras, editoras e artistas.





Quais são os argumentos da Universal e TikTok?


Do Universal Music Group, uma declaração estabelece as prioridades para seu lado do debate: "Sempre lutaremos por nossos artistas e compositores e defenderemos o valor criativo e comercial da música."


Já o TikTok acusa a UMG de ganância e de fazer o oposto, prejudicando seus artistas. “O TikTok tem firmado acordos que colocam os artistas em primeiro lugar com todas as outras gravadoras e distribuidoras. Claramente, as ações em benefício próprio da Universal não são do melhor interesse dos artistas, compositores e fãs."


Sentiu o climão?



O que os artistas têm a dizer?


O momento da remoção das músicas coincidiu com a maior noite da indústria fonográfica - o Grammy Awards. Muitos artistas foram perguntados no tapete vermelho da premiação sobre o que achavam dessa disputa; outros se pronunciaram em suas redes sociais.


A jovem cantora Gracie Abrams disse à Variety esperar que a UMG e o TikTok cheguem a uma solução em breve, além de elogiar os usuários da rede de vídeos pela sua criatividade no uso das canções. O cantor Noah Kahan, que viralizou no app com hits como "Stick Season", também repercutiu em uma entrevista:


Certamente espero que a minha música possa continuar vivendo no TikTok eventualmente. Sou incrivelmente grato por ter passado um tempo construindo uma base de fãs e que irá, assim espero, transcender o TikTok. Torço para que artistas em desenvolvimento saibam que vai ficar tudo bem e que vamos encontrar um caminho para que as pessoas encontrem a música e que as músicas ótimas vençam, independente da plataforma.

O produtor Jack Antonoff, que também lidera o projeto musical Bleachers, também foi pergutado sobre o assunto na sala de imprensa após vencer (mais) um Grammy.


Você tem uma indústria inteira dizendo tipo 'Você tem que fazer de tudo, você tem que fazer de tudo, e aqui está o que você precisa fazer'. E aí um dia, tipo, 'Puf!'. Há muitas coisas erradas [na indústria]. A última vez que eu estive aqui, estávamos falando sobre ingressos; sempre precisamos garantir que, como artista, você não se acostume a ser pago menos, o que eles tentam fazer com que aconteça. Mas acho que é um retrocesso e, no mínimo, nós deveríamos ter sido avisados.

Pegou mal, e especialistas já apostam em um retorno às conversas para que a "turnê de retorno" das músicas da Universal no TikTok aconteça em breve.





O que a remoção das músicas realmente significa


Já não é mais possível utilizar músicas de Taylor Swift, Bad Bunny, SZA, The Weeknd, Billie Eilish e muitos outros nos vídeos do TikTok. Os conteúdos criados anteriormente à data de 31 de janeiro e que utilizavam canções presentes no acordo têm seus áudios mutados a partir de agora. 


Para os artistas que não são da Universal Music, nada muda. Isso é bom e ruim ao mesmo tempo. Se havia uma gravadora com poder o suficiente para impor novas regras de compensação pela música, esta era a UMG. O fato de ela não ter conseguido chegar a um acordo é sintomático de que há um teto para o que é possível pagar pelo conteúdo musical sem quebrar as empresas na outra ponta do negócio. Também significa que não há regras bem estabelecidas sobre questões realmente preocupantes, como a união de IA e música e a utilização de músicas para promover discurso de ódio. 



TikTok


Por que essa “briga de gigantes” importa para o ecossistema da música?


Não é possível salientar de forma mais contundente o tamanho do catálogo da Universal Music, isso porque a empresa não conta apenas com aqueles artistas que lança a partir de seus selos, mas também pela editora, igualmente potente. Não é por acaso, já que ostenta a posição de maior gravadora do mundo - talvez isso explique seu nome. A participação de mercado é em 30%, globalmente. Seu tamanho e alcance servem de posição de vantagem em negociações como a do TikTok, porém neste caso trata-se de um verdadeiro duelo de gigantes. Afinal, o app tem 1 bilhão de usuários ativos mensais em todo o mundo, é um enorme caldeirão de memes e tendências, com a possibilidade de expandir sua influência para o mundo do e-commerce ainda este ano. Ainda assim, gigantes também duelam por centavos, o que impacta diretamente na receita dos artistas.


“O embate entre a Universal Music e o TikTok mostra que nem tudo são flores no que se refere à música digital nos dias de hoje. A produção de conteúdo criativo musical envolve uma cadeia produtiva longa e complexa, que precisa ser valorizada. Mas o que pouca gente se deu conta, é que, além do repertório dos artistas da Universal Music, também serão afetadas as obras da Editora Universal Publishing, o que promete derrubar músicas de praticamente todas as gravadoras do mundo ocidental. Ainda veremos muitos capítulos desta batalha pela frente”, prevê Carlos Mills, presidente da Associação Brasileira da Música Independente (ABMI).




Copo meio cheio ou meio vazio?


Embora acordos como estes raramente tenham suas cifras reveladas, é possível prever uma queda de receita para todos os artistas envolvidos. Estes, porém, não representam os outros cerca de 70% do mercado: a proporção pertencente às outras gravadoras majors, além dos selos com uma fatia menor do bolo e dos artistas independentes. Estes últimos têm entrada no TikTok mediada pelas mesmas distribuidoras que colocam seus sons no Spotify e outras plataformas.


Não é de agora que a conta não fecha, porém atualmente suas repercussões são maiores e mais imediatas. Artistas têm plataformas tão grandes quanto as próprias gravadoras, atingindo muitos milhões de pessoas e as trazendo para o debate em torno de questões antes restritas apenas aos bastidores do music business. São impasses trabalhistas e de direitos que agora mobilizam fãs, seja de Lenine, seja de Taylor Swift.


“Eu observo que o mercado da música passa, uma vez mais, por reformulações importantes, cujo impacto tem a força de mudar paradigmas. Estamos falando sobre a chegada da realidade virtual, das fintechs, da AI. Ou seja, uma vez mais, será necessário uma readaptação por parte de artistas, gravadoras, editoras, etc. Todavia, é muito importante que os direitos de autor, os direitos conexos e a remuneração correta de criadores e criadoras seja garantida. Em suma, essas bilionárias plataformas, como o TikTok e as plataformas de streaming em geral, precisam superar essa inclinação de estar acima da lei. O debate pela garantia da justa remuneração está alocado debaixo de um guarda-chuva onde também se discute, de forma mais ampla, por exemplo, a regulação das redes sociais”, reflete o cantor e compositor César Lacerda

César acompanha de perto o mercado da música. Ele é reconhecido como um dos grandes cantores e compositores brasileiros da geração dos anos 2010, destacando-se por mais de 60 composições em álbuns de renomados artistas, parcerias com grandes compositores e apresentações em diversos países. Sua influência também traz contribuições em trilhas sonoras - como nas novelas “Amor de Mãe” e “Todas as Flores” da Rede Globo; filmes, como “Pai em Dobro”, da Netflix; e seriados, como “NCIS: Los Angeles” da CBS. Já foi interpretado e gravado por artistas como Maria Bethânia, Gal Costa, Zezé Motta, Lenine e Maria Gadú; tem parcerias musicais com compositores de grande expressão como Ronaldo Bastos, Chico César, Paulo Miklos e Jorge Mautner; e já se apresentou em mais de uma dezena de países, sempre em espaços e festivais de grande relevância. Pra completar, César está com mentoria artística aberta para quem quer se desenvolver no mundo da música.


Os fãs, muitas vezes, estão alheios a estes movimentos da indústria. O que não fica claro para o grande público é que construir um catálogo à disposição dos usuários envolve muito investimento financeiro - um boleto que tem chegado agora para as indústrias que tentam sobreviver na era do streaming, como é o caso da música, dos games, do cinema e da TV. O rompimento de dois dos maiores players em seus segmentos leva o assunto para conhecimento de um público menos restrito.


“Acho educativo que estes debates estejam acontecendo aos olhos do público (que, por exemplo, perde por algum tempo a oportunidade de usar uma música em seus conteúdos). O público precisa estar ciente daquilo que consome. E precisa associar o debate da justa remuneração e da proteção de direitos de autor, ao debate, por exemplo, do aperfeiçoamento da democracia. Vitrine para criadores e bilhões para plataformas é uma deformação da democracia”, complementa César Lacerda.

Para os artistas, o fato de que não há mudanças repentinas no momento pode ser, também, uma oportunidade para outros nomes e sons conseguirem espaço para viralizar nos vídeos do TikTok. Não necessariamente pela receita que geraria, mas sim pelas possibilidades que ultrapassam o mundinho do app - não raro, um hit lá reverbera nas paradas do Spotify e da Billboard. 


O futuro para tópico do pagamento pela música e as questões éticas e de segurança que permeiam o ambiente digital talvez estejam longe de uma resolução. O que o fim da parceria entre a UMG e o TikTok revelou é que estamos em um capítulo de uma longa discussão, na qual só os pesos pesados têm voz - por enquanto.


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